28 de outubro de 2009

Afonso Henriques: herói e mito.

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Reparem como Fernando Pessoa, na Mensagem, recupera alguns dos temas de Os Lusíadas, dando-lhes uma nova "roupagem":

D. Afonso Henriques

Pai, foste cavaleiro.
Hoje a vigilia é nossa.
Dá-nos o exemplo inteiro
E a tua inteira força!

Dá, contra a hora em que, errada,
Novos infieis vençam,
A benção como espada,
A espada como benção!

Fernando Pessoa, A Mensagem
 
Afonso Henriques é o símbolo do herói e do mito que representam a formação e a continuidade de Portugal. Compete aos Portugueses de hoje recuperarem o exemplo do rei fundador ("Pai") e romperem a espécie de apatia em que se vive ("hora errada"). É necessário "vencer esses novos infiéis" com uma espada que simboliza a acção. E não esquecer que Cristo lançou a sua "benção"sobre a Nação portuguesa (milagre de Ourique).

26 de outubro de 2009

A batalha de Ourique: um esboço de análise

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Apresento, agora, um exemplo de análise de um dos episódios de Os Lusíadas e as "linhas" temáticas que podemos explorar. Faço-o de maneira esquemática para se tornar mais "legível".

Um dos episódios lido em aula foi o da Batalha de Ourique (Canto III, estâncias 42 a 54).

É um episódio bélico, cujo tema é uma das batalhas mais emblemáticas da nossa história e da nossa importância como Nação.

Porque:
  1. o exército português é comandado por D. Afonso Henriques, primeiro Rei de Portugal que, com esta batalha, legitimamente conquistou esse direito;
  2. o exército português teve a coragem de enfrentar Cinco Reis Mouros e numa (des)proporção de um para cem;
  3. assim sendo, o facto de terem vencido essa batalha e derrotado estrondosamente os Sarracenos confere aos Portugueses uma maior heroicidade;
  4. essa vitória foi alcançada com a “cumplicidade” de Deus, uma vez que Cristo na Cruz se mostrou a Afonso Henriques;
  5. deste modo, a nação portuguesa ganha também um estatuto de nação “eleita” por Deus, o que adivinhava que os portugueses estariam predestinados a cumprir uma missão gloriosa e abençoada;
  6. essa missão revelar-se-ia mais tarde, quando os portugueses partiram para os Descobrimentos para espalhar a fé cristã;
  7. e essa missão cumpriu-se, através da dilatação do Império e da propagação da Religião;
  8. a importância deste feito bélico ficará, simbolicamente, marcado na bandeira, símbolo da nacionalidade, através das cinco quinas, as cinco chagas de Cristo.
Afonso Henriques é um dos estereótipos do herói individual e representa o herói colectivo que Camões se propõe "cantar": o Povo Português!
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21 de outubro de 2009

Os Lusíadas, Proposição: uma proposta de leitura.

1
As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

2
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis, que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles, que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando;
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.

3
Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram:
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.


Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto I
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Esta é a Proposição, as 3 primeiras estâncias de Os Lusíadas, onde o sujeito poético apresenta, resumidamente, o assunto de todo o poema. É o seguinte:


"Cantando", isto é, exaltando e usando o género épico, tentará proclamar e dar a conhecer ao mundo:
  • "as armas e os barões": as batalhas e os homens notáveis ("assinalados") que tiveram a coragem de navegar mares desconhecidos e tentar ultrapassar os seus próprios limites humanos ("mais do que prometia a força humana") para alargarem as fronteiras em locais longínquos;
  • "as memórias dos reis" que lutaram para expandir a Fé cristã em África e na Ásia;
  • a "memória" de todos os que, pelos feitos praticados, nunca mais serão esquecidos, imortalizando o seu nome e o de todos os portugueses ("libertar da lei da morte").
Assim sendo, todos os antigos poemas épicos e heróis (Ulisses, Eneias, Alexandre...) "nada" valem, porque outros heróis e outros feitos os ultrapassaram e aqueles cairão no esquecimento. Os próprios deuses se renderam aos portugueses, o que simboliza o heroísmo que manifestaram na guerra (Marte) e no mar (Neptuno).

Recursos estilísticos predominantes:
  • sinédoque: "ocidental praia lusitana" em vez de Portugal (a parte em vez do todo);
  • hipérbole: "mais do que prometia a força humana" (exagero da realidade);
  • metáfora e perífrase: "se vão da lei da morte libertando"= tornam-se imortais.
Análise formal: estrofes (estâncias) de 8 versos, oitavas; rima cruzada e emparelhada (abababcc); cada verso tem 10 sílabas métricas (decassilábico): «as/ar/mas/e os/ba/rões/a/ssi/na/la/dos».

Destaco, agora, alguns conectores do discurso:
  • "e também": aditivo;
  • "que eu canto o peito ilustre[...]": causal.

20 de outubro de 2009

Não só Autores do Programa...

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Encontrei este poema lindíssimo de Miguel Torga, que não conhecia. Os comentários deixo-os ao vosso critério!

Poema Melancólico a não sei que Mulher

Dei-te os dias, as horas e os minutos
Destes anos de vida que passaram;
Nos meus versos ficaram
Imagens que são máscaras anónimas
Do teu rosto proibido;
A fome insatisfeita que senti
Era de ti,
Fome do instinto que não foi ouvido.

Agora retrocedo, leio os versos,
Conto as desilusões no rol do coração,
Recordo o pesadelo dos desejos,
Olho o deserto humano desolado,
E pergunto porquê, por que razão
Nas dunas do teu peito o vento passa
Sem tropeçar na graça
Do mais leve sinal da minha mão...

Miguel Torga, in 'Diário VII'
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19 de outubro de 2009

Antes de Camões...


Luís de Camões é o primeiro escritor do programa deste ano, com a sua obra épica, Os Lusíadas.
No entanto, antes de escrever aqui alguma coisa sobre ele, gostaria que lessem alguns poemas de outros poetas que, em discurso lírico, assim manifestaram a sua admiração pelo homem e pela obra. Vários são os exemplos: Jorge de Sena, Miguel Torga e, como é óbvio, o próprio Fernando Pessoa que nos ocupará depois.

Destaco, em jeito de apresentação, um poema de Miguel Torga:

Camões

Nem tenho versos, cedro desmedido,
Da pequena floresta portuguesa!
Nem tenho versos, de tão comovido
Que fico a olhar de longe tal grandeza.

Quem te pode cantar, depois do Canto
Que deste à pátria, que to não merece?
O sol da inspiração que acendo e que levanto
Chega aos teus pés e como que arrefece.

Chamar-te génio é justo, mas é pouco.
Chamar-te herói, é dar-te um só poder.
Poeta dum império que era louco,
Foste louco a cantar e louco a combater.

Sirva, pois, de poema este respeito
Que te devo e professo,
Única nau do sonho insatisfeito
Que não teve regresso!

Breve comentário: Sempre o "canto", a grandeza, pátria, herói, génio, império, loucura, combate, poeta, nau, sonho, como topoi ("tópicos") de textos que se relacionam com Camões e Os Lusíadas.

15 de outubro de 2009

Renascimento: uma nova visão do Homem e do Mundo


O Renascimento surge em Itália, onde eram mais visíveis as marcas de uma civilização brilhante que, por todo o lado, evidenciava o esplendor da Antiguidade.
  • apreço e admiração pela Antiguidade Clássica, mas sem entrar em ruptura com a Fé Cristã;
  • relevo dado ao Homem, destacando o seu poder de criação, a sua inteligência e a sua capacidade de realização individual;
  • a Antiguidade torna-se um modelo a imitar: nos ideais de vida, de cultura e de civilização;
  • estudo aprofundado dos seus Autores, numa procura incessante de Saber: só assim se poderia conhecer melhor o Homem e a sua natureza;
  • importância dos Humanistas, uma nova aristocracia intelectual, que adoptaram o latim como veículo de expressão e de comunicação.
Em Portugal, viveu-se uma época brilhante, no reinado de D. João III (século XVI):
  • humanistas portugueses que ensinam nas universidades estrangeiras;
  • humanistas estrangeiros que são convidados a ensinar em Portugal.
Foram estes Homens que, percorrendo toda a Europa, fizeram circular ideias e, sobretudo, o «novo mundo» que os Descobrimentos desvendaram.
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6 de outubro de 2009

Programa do 12º Ano:

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Apresento-vos os conteúdos programáticos do 12º Ano:

  • Luís de Camões, Os Lusíadas;
  • Fernando Pessoa, Mensagem e poesia ortónima (assinada com o nome de Fernando Pessoa, ele próprio);
  • Heterónimos de Fernando Pessoa:
          -Alberto Caeiro, O guardador de rebanhos;
          -Ricardo Reis, Odes;
          -Álvaro de Campos;
  • Luís de Sttau Monteiro, Felizmente há luar;
  • José Saramago, Memorial do convento.
Para Fernando Pessoa, indico um endereço electrónico, onde é possível encontrar um grande
número de poemas do ortónimo e heterónimos. Ver AQUI.

2 de outubro de 2009

Começar no Outono...


Início das aulas, início de mês, início do Outono...
Este ano, lecciono três turmas do 12º Ano. Projecto novo, novo blogue.

O que está ali "ao lado", o AAamo-Te, acompanhou-me ao longo de 2 anos de 11º Ano e foi
um desafio que me encheu de orgulho e satisfação! Com ele aprendi, com ele ensinei...

E que melhor intróito para um novo Ano, que a música?? 
O resto ficará para depois, vai-se construindo, pouco a pouco...
Que seja um Bom Ano para todos nós!



Balada de Outono, Zeca Afonso