5 de fevereiro de 2014

Os Lusíadas, Proposição

1
As armas e os barões assinalados,
Que da ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca de antes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;

2
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis, que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles, que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando;
Cantando espalharei por toda parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte.
 
3
Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram:
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.
 
Luís de Camões, Os Lusíadas, Canto I
__________________________________________________________________________________
Esta é a Proposição, as 3 primeiras estâncias de Os Lusíadas, onde o sujeito poético apresenta, resumidamente, o assunto de todo o poema. É o seguinte:
"Cantando", isto é, usando o género épico, tentará proclamar e dar a conhecer ao mundo:
  • "as armas e os barões": as batalhas e os homens notáveis ("assinalados") que tiveram a coragem de navegar mares desconhecidos e tentar ultrapassar os seus próprios limites humanos ("mais do que prometia a força humana") para alargarem as fronteiras em locais longínquos;
  • "as memórias dos reis" que lutaram para expandir a Fé cristã em África e na Ásia;
  • a "memória" de todos os que, pelos feitos praticados, nunca mais serão esquecidos, imortalizando o seu nome e o de todos os portugueses ("libertar da lei da morte").
Assim sendo, todos os antigos poemas épicos e heróis (Ulisses, Eneias, Alexandre...) "nada" valem, porque outros heróis e outros feitos os ultrapassaram e aqueles cairão no esquecimento. Os próprios deuses se renderam aos portugueses, o que simboliza o heroísmo que manifestaram na guerra (Marte) e no mar (Neptuno).
 

Sem comentários:

Enviar um comentário